Leves rabiscos sobre o poema Um Bem-te-vi

“Segundo Roland Barthes , a função utópica da literatura consiste na busca infinita de representar o real através da linguagem. Essa utopia da linguagem presentifica-se no texto a partir de “expedientes verbais” que tentam encenar a realidade.”



UM BEM-TE-VI

O leve e macio
raio de sol
se põe no rio.
Faz arrebol...

Da árvore evola
amarelo, do alto
bem-te-vi-cartola
e, de um salto

pousa envergado
no bebedouro
a banhar seu louro

pelo enramado...
De arrepio, na cerca
já se abriu e seca.

BARROS, Manoel de. Um bem-te-vi, In: Compêndio para uso dos pássaros. 3ª [ Ed. Rio de Janeiro: Record, 1999. P.31.

Ah, Manoel de Barros ... Poeta que se vale do ambiente natural de sua terra natal e retrata através das palavras, como um “take fotográfico”, imagens simples e precisas da natureza como o banho de um bem-te-vi... Primeiramente é feita uma descrição do cenário natural: O leve e macio/raio de sol/ se põe no rio./faz arrebol; percebe-se a mistura de dois órgãos dos sentidos humanos: o tato e a visão, com a finalidade de retratar o pôr-do-sol no rio com suas cores amarelovermelhoalaranjadas. As reticências representam o entardecer desse dia com as suas propagações de cores quentes e marcantes.
Na segunda estrofe, inicia-se a descrição da motivação do presente poema, o bem-te-vi. Ele surge, em vôo do alto da árvore e na passagem dessa estrofe para a próxima, o eu - lírico faz uma pausa para representar o vôo da ave: e, de um salto/pousa envergado, assim como na passagem da terceira estrofe para a quarta, delicadamente somos testemunhas do banho do bem-te-vi, seguido do posterior contato das penas do pássaro com a folhagem ao seu redor. Todos esses acontecimentos se sucedem encadeados na passagem de uma estrofe para outra, na tentativa de representar, em palavras, uma imagem tão corriqueira da natureza.
Por fim, os versos De arrepio, na cerca/já se abriu e seca nos remete ao movimento ligeiro que as aves fazem quando se secam após um banho.
Eis mais um exemplo de beleza literária que busca eternamente retratar a vida através de recursos lingüísticos excepcionais que nos presenteiam com versos de muita leveza, beleza e singeleza.Termino assim, com uma citação do autor do poema:
Quando as aves falam com as pedras e as rãs com as águas - é de poesia que estão falando.

[Manoel de Barros]

Nota explicativa sobre o post: Leitura do poema proposto pelo professor de Teoria da Literatura I,no meu 1° semestre da faculdade de Letras Língua Portuguesa, datado de 18 de novembro de 2002...

Comentários

Nathi disse…
Nossa, isso sim é uma ótima degustação com diretio de saber como foi feito o prato pelo mestre!!

Maravilhoso!!

beijos

Ps:Obrigada por ser mais uma ammiga blogal!!
GABRIEL, gustavo disse…
Nem o tempo apaga uma boa aula, hein?

Estou satisfeito, vou tirar minha soneca depois do almoço.

Afinal, um prato desse, é daqueles que nos faz dormir sorrindo.

; ]
Unknown disse…
Adorei seu blog.
Lindo e muito saboroso!

Parabéns!
O poema é lindo, Menina, ainda mais pelo fato das palavras representarem um pássaro, que são animais que me atraem muito. A descrição do poema está muito boa, parabéns.
Mimi disse…
Adoro uma análise literária ^^
Tenho preguica de fazer, gosto de ler a dos outros =D
Ou melhor, gosto de ler as suas! (Lembra da vez q ce me ajudou na facul?)
Charles C. disse…
Gostei bastante de degustar as suas palavras!
Parabéns.
voltarei mais vezes por aqui...
Abraço
DÉBORA disse…
Claro que lembro, Mimi ^^
Obrigada!

:*
Nathi disse…
Olá, indiquei seu blog para um selo muito especial, vá na minha página: http://meupretextodiario.blogspot.com/2009/02/presentemas-nem-e-aniversarioo.html

e saiba como recebê-lo!
Beijos e sucesso!

P.s:estou esperando você postar algo aí de novo!
Fernando disse…
Sim, Manoel de Barros é fantástico: o poeta das coisas ínfima.
Fiz um poema em homenagem a ele: está em vareiosedesvarios.blogspot.com
Abraços
Fernando

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